Baixa-Chiado

"Que calmaria desgraçada".entoou Joseph.
Numa daquelas tardes acinzentadas, uma pacatez aparentemente absurda por volta das 17:00, o tempo quis ser seu amigo.
Falou-lhe de como eram as vezes em que ele subitamente acelerava; ele de pe, ouvia com plena atençao. Foi entao que dedicou essa tarde so para ele. Quis explicar-lhe na soma das vezes que alto gritou o seu nome, o seu silencio ;e ele, intruso, nem som de eco nem tom sumido. Nada!Volvido o tempo de mau estar, fez-se ouvir em vento.Nem clic clac clic clac que o identificasse. Depois de percebidos os motivos, dedicou-lhe a sua arte; e ele, nesse instante, ficou sem existir.
Numa viagem incrivel trouxeste a questao da cidade inabitada, levaste-o para o centro olissiponense como exemplo e disseste:
"Vivem tao perto uns dos outros que nada veem. Esta impropria partilha de extractos de cidade que vos afastam. Sao seres distantes.Apartados. Abunda a fragilidade social. Marginal?claro!
Imunes ao dialogo, sao possivel tempo inexacto. Vivem mutilados de ideias. Amotinados numa cela gigante. Pensamentos vagarosos que nao vos preenchem.
Julgas-te capaz de enfrentar a tirania da aceleraçao do desgaste corporeo? Voces privam-me do prazer, matam-me tambem na razao da minha velocidade estonteante. Pessoas jogadoras da vida do povo que nos desafiam.
Destas vontades emergentes como a tua entendo em zero afilado.Olha a tua volta, que ves? De todos os sujeitos que sobem e descem a calçada portuguesa numa mera imposiçao comercial salvam-se os que escolhem a rua como local de eleiçao, de idilio. Eu nao sou para ser contado.
Nao sirvo nem para horas de ordenado nem para comunicantes televisivos com segundos contados:"Pai, Pai, vai começar..."; eu nao uso relogio. Nao conheço um tempo hermetico, nunca o fui. Eu sou o tempo. Se me perguntasse segundo a segundo a minha existencia, nao teria vivido. E tu?"
Joseph ia a responder quando a pergunta ficou assim, em pleno ar, a pairar.
Soube logo que a resposta era dada em som zero, ao longo da vida, como o tempo fazia.