domingo, agosto 28, 2005

Lista de desejos

desejo ver o mundo dissipado desta "pele Homem" que se tornou.

tomem lá disto!

Elogio ao amor (Miguel Esteves Cardoso - Expresso )


"Há coisas que não são para se perceberem. Esta é uma delas.
Tenho uma coisa para dizer e não sei como hei-de dizê-la.
Muito do que se segue pode ser, por isso, incompreensível.
A culpa é minha. O que for incompreensível não é mesmo para se perceber.
Não é por falta de clareza. Serei muito claro. Eu próprio percebo pouco do que tenho para dizer. Mas tenho de dizê-lo. O que quero é fazer o elogio do amor puro. Parece-me que já ninguém se apaixona de verdade. Já ninguém quer viver um amor impossível. Já ninguém aceita amar sem uma razão. Hoje as pessoas apaixonam-se por uma questão de prática. Porque dá jeito. Porque são colegas e estão ali mesmo ao lado. Porque se dão bem e não se chateiam muito. Porque faz sentido. Porque é mais barato, por causa da casa. Por causa da cama. Por causa das cuecas e das calças e das contas da lavandaria. Hoje em dia as pessoas fazem contratos pré-nupciais, discutem tudo de antemão, fazem planos e à mínima merdinha entram logo em "diálogo". O amor passou a ser passível de ser combinado. Os amantes tornaram-se sócios.
Reúnem-se, discutem problemas, tomam decisões. O amor transformou-se numa variante psico-sócio-bio-ecológica de camaradagem. A paixão, que devia ser desmedida, é na medida do possível. O amor tornou-se uma questão prática. O resultado é que as pessoas, em vez de se apaixonarem de verdade, ficam "praticamente" apaixonadas. Eu quero fazer o elogio do amor puro, do amor cego, do amor estúpido, do amor doente, do único amor verdadeiro que há, estou farto de conversas, farto de compreensões, farto de conveniências de serviço. Nunca vi namorados tão embrutecidos, tão cobardes e tão comodistas como os de hoje. Incapazes de um gesto largo, de correr um risco, de um rasgo de ousadia, são uma raça de telefoneiros e capangas de cantina, malta do "tá bem, tudo bem", tomadores de bicas, alcançadores de compromissos, bananóides, borra-botas, matadores do romance, romanticidas.Já ninguém se apaixona? Já ninguém aceita a paixão pura, a saudade sem fim, a tristeza, o desequilíbrio, o medo, o custo, o amor, a doença que é como um cancro a comer-nos o coração e que nos canta no peito ao mesmo tempo? O amor é uma coisa, a vida é outra. O amor não é para ser uma ajudinha. Não é para ser o alívio, o repouso, o intervalo, a pancadinha nas costas, a pausa que refresca, o
pronto-socorro da tortuosa estrada da vida, o nosso "dá lá um jeitinho sentimental". Odeio esta mania contemporânea por sopas e descanso. Odeio os novos casalinhos. Para onde quer que se olhe, já não se vê romance, gritaria, maluquice, facada, abraços, flores. O amor fechou a loja. Foi trespassada ao pessoal da pantufa e da serenidade. Amor é amor. É essa beleza. É esse perigo. O nosso amor não é para nos compreender, não é para nos ajudar, não é para nos fazer felizes. Tanto pode como não pode. Tanto faz. É uma questão de azar. O nosso amor não é para nos amar, para> nos levar de repente ao céu, a tempo ainda de apanhar um bocadinho de inferno aberto. O amor é uma coisa, a vida é outra. A vida às vezes mata o amor. A "vidinha" é uma convivência assassina. O amor puro não é um meio, não é um fim, não é um princípio, não é um destino. O amor puro é uma condição. Tem tanto a ver com a vida de cada um como o clima. O amor não se percebe. Não é para perceber. O amor é um estado de quem se sente. O amor é a nossa alma. É a nossa alma a desatar. A desatar a correr atrás do que não sabe, não apanha, não larga, não compreende. O amor é uma verdade. É por isso que a ilusão é necessária. A ilusão é bonita, não faz mal. Que se invente e minta e sonhe o que quiser. O amor é uma coisa, a vida é outra. A realidade pode matar, o amor é mais bonito que a vida. A vida que se lixe. Num momento, num olhar, o coração apanha-se para sempre. Ama-se alguém. Por muito longe, por muito difícil, por muito desesperadamente. O coração guarda o que se nos escapa das mãos. E durante o dia e durante a vida, quando não esta lá quem se ama, não é ela que nos acompanha - é o nosso amor, o amor que se lhe tem. Não é para perceber. É sinal de amor puro não se perceber, amar e não se ter, querer e não guardar a esperança, doer sem ficar magoado, viver sozinho, triste, mas mais acompanhado de quem vive feliz. Não se pode ceder. Não se pode resistir. A vida é uma coisa, o amor é outra. A vida dura a Vida inteira, o amor não. Só um mundo de amor pode durar a vida inteira. E valê-la também."

Miguel Esteves Cardoso Expresso

sexta-feira, agosto 26, 2005

Miles davis

ouvir miles naqueles devaneios
naquela loucura aparente
percebo que beleza nao tem medida certa
tempero resolvido

lia sobre ele no outro dia e tudo o que se diz sobre o seu talento cai em exagero
ou nem sempre ]e justo
para mim ouvi-lo ]e o maior elogio
mesmo que nao nos apercebamos da sua tecnica
do seu toque
da sua envolvencia

que mestria

terça-feira, agosto 23, 2005

M.E.C.

viagem numero dois

Islantilla
Sevilha
Granada.

Elogio do amor- Miguel Esteves Cardoso

lindo o texto, pena que n posso escrever agora!!
enfim, fica para sabado ou domingo.

afinal já chegou domingo e já está escrito, publicado, "what ever"...vejam!

sábado, agosto 20, 2005

Sugestão cinematográfica número seis ou sete

Closer

princípio de qualquer coisa (música, lugar número um)
paixão exacerbada
amor provocado
como arma
egoísmo
A fragilidade das relações torna-as obcessivas
A obsessão torna-as ainda mais débeis
doentias
A realidade presente de viver com a sombra do amor e do seu significado assombra-nos
persegue-nos
confusão dos sentimentos
confudimos
confundimo-nos
profusão de pensamentos
momento de rotura
recomeço
começo do princípio ( A mesma música, lugar número dois)

Julia Roberts
Natalie Portman
Jude Law

Fotografia|Poesia

Joseph Kudelka

quinta-feira, agosto 18, 2005

Ballet Gulbenkian

Ao longo dos tempos as boas coisas também acabam
só as boas coisas acabam
nada parece querer começar
recomeçar
tudo quer acabar
tudo é não
nada é positivo, afirmativo, sim
maldito o tempo que não passa
o tempo maldito que não dança
empenam a dança maldita do tempo
o tempo parado
recomeçado
dança de contorno obsidiante
adiante
luta pelos que cedo param
pelos que tarde vos observam
no pano caído da desgraça

quarta-feira, agosto 17, 2005

Viagem|Sudoeste Alentejano Costa Vicentina

Dia 1

Lisboa

Alcácer do Sal

Sines

São Torpes

Porto Côvo

Vila Nova de Mil Fontes

Cabo Sardão

Zambujeira do Mar (paragem para dormida e saída à noite)

Dia 2

Algezur

Monte Clérigo

Arrifana (pena não ter ido)

Carrapateira

Vila do Bispo

Sagres

(viagem de volta)

Vila do Bispo

Carrapateira

Algezur

Odeceixe

S.Teotónio

Odemira

Ourique

Lisboa

Torres Vedras

Lisboa

segunda-feira, agosto 15, 2005

Avô Artur

Neste mundo Terra onde tudo começa
recomeços a acabar num final
Estrondoso final
na mais vil forma
um fechar de pano a sós
que atróz
remetido a um silêncio não escolhido
perduras num saudoso eco
um eco de vida
da vida
a tua
Nesta sala Galáxia
casa Universo
passeias o homem que és
deixas no degrau das nossas vidas as marcas inolvidáveis da tua força
a tua presença
que leveza
Foste força até ao fim
fizeste-nos sorrir até ao fim
o princípio de uma outra viagem
passas pelo portal que todos chegamos
por onde todos nós saímos

domingo, agosto 14, 2005

chamas-te férias

hoje parto à descoberta de um portugal estendido sobre o mar.
hoje descobrirei terras inventadas em canções
saberei onde parar, não saberei onde acabar.
com um livro de um autor qualquer
outro por escrever
vou em busca de um momento parado
onde ouves o som a subir em passo-lento
onde a personagem ganha vigor
a arquitectura ganha vivências próprias
onde eu posso sentir
a leveza das letras a passar
a constituirem-se palavras
sentidos
que não tenho conseguido achar

com pouca coisa na bagagem
calções para um mergulho despreocupado
e pouco mais
alguns trocos no bolso
o depósito cheio
uma garrafa de água e uma muda de roupa
adianto-me para sul
para o azul que é costa mas não é de prata
as paragens
essas
serão descritas numa outra oportunidade
Barcelona fica para a proxima semana

sexta-feira, agosto 12, 2005

Fim

quando voltaste, os teus e as tuas mãos eram chamas a falarem para mim.

eu estava na cama onde nasci vezes de mais
peço-te, nunca esqueças o meu olhar de quando voltaste.

era de noite. eu não esperava mais nada.

e tu voltaste. tão bonita.

és tão bonita.

és tão bonita. no mundo, deve haver um jardim tão bonito como tu.

voltaste.

eu sorri tanto. fui feliz e, nesse momento, morri.

José Luís Peixoto

Depois das chamas

Era um caminho por onde passávamos de mãos dadas quando éramos namorados e acrecditávamos apenas em coisas eternas. Tínhamos catorze anos. Era a minha mãe, com um chapéu redondo, todo enfiado na cabeça, e o meu irmão, com calções desbotados, a conversarem vozes serenas e a procurarem pinhas quase casualmente. Eu, atrás deles, calado, segurava uma saca com as duas mãos e aceitava as pinhas que a minha mãe e o meu irmão apanhavam, e que haveriam de acender a lareira no inverno.Tinha dez anos.Era as tardes, Maio, em que eu e o meu irmão brincávamos depois da escola e, de repente, o meu irmão ficava em silêncio, desaparecia, deixava de respirar; e eu procurava-o por trás dos pinheiros, eu dizia:"já chega, já não tem graça "; e o meu irmão aparecia apenas quando o aperto que eu tinha no coração começava a tornar-se insuportável. (...)


José Luís Peixoto

quinta-feira, agosto 11, 2005

Sideways

Além do vinho e da vontade de comer uvas (não fui ao vinho mas engoli umas uvas) fica a jornada de dois amigos de modos de vida antagónicos mas que são melhores amigos!as relações tangenciais de um (as do outro não tanto) dão o mote para uma viagem de auto-conhecimento com instantes divinos de sorriso incontido. Muito pelas piadas subliminares...

Nessa viagem atrai-me a subtileza captada em pessoas distintas, próximas mas com modos de vida e distancias sociais e humanas vincadas.
Quando vejo ou leio mais mundo, mais me atrai a diferença e nas circunstâncias mais humildes e escassas maiores serão essas possibilidades de serem entusiasmantes;
porque o mundo sustenta-se disso mesmo.
O filme é mais curto na razão de ser tratado na escala da relação de pessoas de uma mesma cultura; de outra dimensão de proximidade.
Curiosas as viagens assim...

Midlife Crisis?

FunK/JAzz

Pulp Fusion, Vol. 1 - Funky Jazz Classics & Original Breaks from the Tough Side (1997)

quarta-feira, agosto 10, 2005

terça-feira, agosto 09, 2005

Estação central

O comboio seguia para sul.Para trás tinham ficado dois anos da sua vida, deixados na caixa do correio juntamente com as chaves do apartamento. Ainda esrevera uma nota de despedida, mas tinha acabado por rasgá-la. As chaves sozinhas diriam mais do que ela seria alguma vez capaz de expressar.ainda lhe ecoavam nos ouvidos as palavras amargas das últimas semanas, as frases ditas sem pensar, mas sentidas há muito tempo. Apanhara o primeiro comboio para sul. Decidira ir a Roma, sempre tinha querido conhecer essa cidade.
A carruagem estava cheia, havia inúmeras pessoas de pé, todos falavam alto, o calor era intenso.Pouco lhe importava.
Sorria, sem entender bem porquê. Talvez de esperança. Fechou os olhos e deixou-se embalar pela cadência monótona do comboio em movimento. Adormeceu.
Ele esperava o comboio do sul.
Nele deveriam vir os seus amigos, com quem combinara encontrar-se em Roma. A estação fervilhava de pessoas de todas as idades, raças, credos, uma amálgama de gente, colorida e agitada. Chegara com uns dias de antecedência. Logo que se reunisse com os outros, partiriam para a Grécia e depois para a Turquia. Seguir-se-ía a Ásia. Tailândia, Malásia, Índia e talvez o Nepal. Não existia limite para o fim da viagem.Tinham o passado dois anos a trabalhar enquanto acabavam a faculdade. Agora passariam outros dois a viajar, a conhecer mundo, antes de regressarem à Argentina.
Ela acordou. Havia uma movimentação de malas e sacos em todos os sentidos dentro da carruagem.Olhou para o relógio.Deviam estar mesmo a chegar a Roma. Não tivera tempo de avisar a única amiga que conhecia na cidade, uma siciliana que morava num pequeno estúdio ao lado do vaticano. Era Agosto, lembrou-se de repente que fiorella poderia estar em Palermo. Não se preocupou tinha tomado a decisão de partir, tudo o mais deixara de ter qualquer importância. O comboio abrandou a sua marcha e acabou por parar, com um solavanco que lhe pareceu de alivío. Uma por uma, as pesssoas íam saíndo.
No meio da agitação, ele tentava em vão descobrir um dos amigos.Desviando-se aqui e além de uma bagagem abandonada ou de um turista distraído, percorreu com o olhar todas as carruagens até se certificar do que já lhe parecia evidente.
Eles tinham perdido o comboio, restava-lhe esperar pelo próximo.
Desanimado, preparava-se para abandonar a estação quando a viu. Ela distinguiu de imediato a sua cabeça loira no meio da multidão. Ambos sorriram porque souberam logo que se íam conhecer.

Cláudia Clemente
Arquitecta

sexta-feira, agosto 05, 2005

refracção

Balanço

Polaroid

Peguei nas minhas coisas e parti.
não me perguntem o nível de inconsciência.
achei que a Matilde parára, achei-a petulante
Naquela pausa, aquele instante
errante
errado
rompi o espaço através de um simples premir no mecanismo de luz
roubei um tempo parado
frame roubado.
desviado do espaço
encostado em sombra
de sobra
levei comigo, sem pedir emprestado
No teu movimento sem pose mostraste-te
mostras-me que não é a foto.
mas que naquele momento movimento estagnado
seduzes e fazes sonhar
fazes-me sonhar
Fazes parar
paras-me
diante do senhor que me fez abrir a carteira
abrir-te
e eu ali
a ver.te
em papel
entre papéis e outras trivialidades
manhã ou tarde
já não sei
frases ditas imagens cor tépida
assim-assim
engolida palidez de tom sépia
naquele gesto intemporal onde mergulhas
invulgar
polaroid de um dia vulgar
polaroid de um dia passado

quarta-feira, agosto 03, 2005