quarta-feira, setembro 06, 2006

autocarro psicadélico

Decidi ir espairecer a cabeça.
Decidi não aparecer.
Encontar um lugar de repouso onde me pousasse e deixasse ficar. Saí sobre uns pés desconhecidos, desgastados talvez. Hoje saíste à rua pela segunda tentativa e meia; assim como ontem teria sido a tua penúltima se não fosses teimosa. São imagens que produzes.

Revolves escombros de paixão.
Eu viajo.
Prometes-te sempre que decidirás o interessante da tua vida, alcançar cedo a leveza e o descanso, para recortar e então cerzir os medos dos outros.

Subtilmente entornei os meus pés por essas vidas que são de outros. Aquela cidade chamava-te a todo o instante. As luzes psicadélicas que são sempre assim. E só da primeira foram estranhas. Agora são só sempre as mesmas. Agora são só mesmo as mesmas. Todos os momentos que reflectia surgia a ideia de uma cidade leve mas ela de leveza tinha tão pouco que assustava. Iludir-me com esta urbe seria dizer mentira e distintamente sumptuosa, livre de amargura.
Descalçei-me.
Pus-me à vontade, dizia eu: mais leve.
Os temores não se descalçam por mais que tentasse, por mais botas e sapatos que descalçasse os outros não se faziam acompanhar e permaneciam; pungentes.
Fugi porque queria ser livre. E agora, em dor, voltar é matar-me à frente dos outros. É mostrar as impressões de um crime.
Arrumei os sapatos à porta de casa como os ingleses, percorri os tacos de madeira com a planta do pé, sentindo-os pelas suas imperfeições. Levei-me até ao escritório onde adormeci a ver as luzes exteriores por entre o grande vão que irrompia por dentro da cidade. A linha perfeita, o contorno daquela cidade abunda-me e percorre-me. Sortudos são aqueles que a obtêm sem ter que pedir. E eu pedi esta cidade.
Quis vir para cá quando estudava psicologia em Lisboa. E este autocarro de dois andares levou-me para longe.
Insulto-me diariamente e nem por isso abro a boca. Tudo corre por dentro.
Sobra-me o autocarro que me leva a um destino indefinido. Escuso-me de tentar escolhê-los, eles são mesmo sobrantes, tal como o autocarro que me carrega. Sobre o seu dorso traz também roupas antigas, sapatos usados, e dores presentes.

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