terça-feira, julho 10, 2007

A menina descansada...

Tocou o relógio e o acordar dela era sempre assim, ajeitava os óculos pois nunca estavam direitos, parecia mesmo que o seu rosto era assim, desenhava-se por aqueles óculos desarrumados que depois tornavam-na assim, escondida, depois, seguia-se o tumulto de se levantar e estar tudo fora do sítio. Era um concerto diário de movimentos que a faziam acordar, e então despertar. A sua primeira decisão era escrever o seu dia, e, mesmo que não seguisse os passos que estipulára, fazia sempre questão de os escrever, uns mais sonhos que outros, mas no fim ficava um sabor de alegria porque sabia mesmo o que era sorrir, mesmo que trancado pelas possibilidades que a vida lhe oferecia.
Por dentro do sotão, onde dormia, a menina repetia os seus gestos com prontidão e sonhava por dentro das impossibilidades, se alguém por um pedaço de momento que fosse pudesse entrar por ali fora, irrompesse pela sua alegria, perceberia a mágoa que a fazia sorrir, aquelas angústias passadas marcavam-lhe os pés, golpearam-na e ela apenas convivia com isso, já esquecera esses tormentos com a soma dos anos passados, ainda assim marcavam-na pelo pior dos sítios, a sua auto-estima. Essa menina que falo gostava imenso de bolachas e adorava brincar sozinha, verdadeiramente não conseguia brincar com mais ninguém sem que pensasse que lhe iriam fazer mal, era uma pequenina muito pouco sociável mas sempre uma criança adorável.
Aprendeu a crescer sozinha por entre as dificuldades que o seu Avô passava. Era o seu único apoio mas era um senhor já muito velho e a sua saúde ficava cada vez mais instável...
Por um dia mostrou todas as suas manias, as suas colecções, os seus recortes, as suas músicas, por um dia mostrou-se mais. A pequena crescera e ficára uma linda rapariga, os seus olhos eram magníficos e traziam tanta luz por dentro, já não existia aquela dor, já não se sentia escondida do mundo. A pequena agora era grande, a sua alma tinha um tamanho sem fim, as suas ambições, os seus sonhos, era uma menina, sim, nos seus olhos largos de tom suave em castanho mel em tudo mais era uma mulher, pronta para abraçar a felicidade, pronta para receber quem a amasse, mas tudo sem pressas, percebeu que apenas ela a faria chegar aos seus intentos, perseguindo os dias um-a-um, sem a pressa de fazer ou de errar, apenas com a certeza de ter realmente vivido!
É uma certeza difícil mas amenizável... mas fazer mais por nós é um assunto interminável...é tão interminável quanto a vida desta pequena que sulcou as terras da desigualdade e deixou-as lavradas; tornou-as mais felizes, com mais esperança, com mais sorrisos...A pequena agora crescida devolvia em duplicado os sorrisos que não teve, abraçou com os braços que nunca sentiu, percorreu por todos os pequenos rostos que vira e ensinou-os a sorrir e a sonhar, os sonhos que por pouco ficavam por terra...os sonhos pelos quais lutou e viu que afinal tudo é ultrapassável, Os seus pés, no fim, traziam terra, mas o seu coração trazia brilho em pó e no seu reflexo: África .
A menina voltou.
a menina tinha agora 94 anos.
a menina sorria descansada.

6 comentários:

Anónimo disse...

Então? Nunca mais acabas de jantar? O que aconteceu à menina descansada...

joaopedromira disse...

a menina descansada ...uhmmm..

fica para mais logo.
entretanto tive que sair,a história está na cabeça, e daqui n sai!


está quase..um quase longo!

Anónimo disse...

Fiquei com lágrimas nos olhos. 94 anos? Já me deste mais 4 anos de vida... :P

Era tão bom que fosse assim, até lá continuo a sonhar! Sempre! :D

Anónimo disse...

sim...dei-te sim...
:)

adoro-te menina descansada.

pinky disse...

lindo lindo lindo!
sim tudo é ultrapassável!
como costumam dizer o que não mata engorda, ou como quem diz, fortalece-nos.
grande "história"

pinky disse...

hihihihihi agora percebi o que acontecia qd duas alminhas íam apanhar ar e mosquitos para a esquina de um campo....