sexta-feira, agosto 12, 2005

Depois das chamas

Era um caminho por onde passávamos de mãos dadas quando éramos namorados e acrecditávamos apenas em coisas eternas. Tínhamos catorze anos. Era a minha mãe, com um chapéu redondo, todo enfiado na cabeça, e o meu irmão, com calções desbotados, a conversarem vozes serenas e a procurarem pinhas quase casualmente. Eu, atrás deles, calado, segurava uma saca com as duas mãos e aceitava as pinhas que a minha mãe e o meu irmão apanhavam, e que haveriam de acender a lareira no inverno.Tinha dez anos.Era as tardes, Maio, em que eu e o meu irmão brincávamos depois da escola e, de repente, o meu irmão ficava em silêncio, desaparecia, deixava de respirar; e eu procurava-o por trás dos pinheiros, eu dizia:"já chega, já não tem graça "; e o meu irmão aparecia apenas quando o aperto que eu tinha no coração começava a tornar-se insuportável. (...)


José Luís Peixoto

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