Afastei-me da música.
Por dias afastei-me dos sons, tentei libertar-me da sensação oca de não pensar com razoabilidade nem de me balizar, sinto que a minha música tem tempos indefinidos, sei que não são pausas, são instantes longos de meditação. O piano não se partiu, fechou-se. Encerro-o, encerramo-lo porque a música já não era a mesma, prendeu-se, inexplicavelmente; aqueles sons que traziam azul e brisas eram agora momentos de angústia e recúo, não era uma tortura, estou certo disso. Adoro o meu pequeno piano, adoro a minha música, mais, adoro o teu som pianinho... Acho que dele sei que posso esperar tudo, sei que me acompanhou por dentro e sei que viajámos por dentro dos sons, por dentro das palavras, os dois, a dois; fechámos um piano cansado, não foi? Fechámo-nos para reabrir as portas do azul e do espaço, das brisas e do mar. Assim, soltos...Não sou um belo pianista que pretenda chegar ao topo, pretendo meramente chegar a ti, meu piano. Gostava de pousar as mágoas e partir. Deixar-me seguir por lados que me levas e me apresentaste. Deixar-me levar por caminhos novos sem tanto questionar, sem perguntar teimosamente: porquê?
Quero prosseguir sem deixar dúvida, és o meu piano mas agora os tempos exigem que tu sejas tu, e nem que seja o silêncio das notas ou os resquícios que me façam chegar para perto, nem que morda as pautas de papel, as notas duras e pungentes. É o mínimo suportável. Um perto longe. Preciso agora que descanses piano pequeno. Tu precisas de voltar ao descanso das cordas mais suaves, seja que silêncio for, seja que pianista chegar. A minha casa ficou mesmo aberta quando os sons saíram, quando eles ameaçaram sair de vez. Ficou aberta mas não fica em pausa. Não te disse mas ela ficou assim, um portal só para ti pianinho, sei que terás uma nova sala, onde caberão os teus mais aprimorados tons. Eles dariam cor na mais triste sala, mas não é isso que precisas agora...necessitas de sonhar e de fazer sonhar...Precisas de uma sala mundo que tem a tua cara, para que possas escolher sem pressas. Sei que o teu tempo é de renovação, e sei que o meu espaço cansou os teus movimentos suave, sei porque sinto essa mágoa. És um Lindo piano e não preciso de parar para saber disso, não preciso de uma memória Mestre, não preciso de fazer um grande esforço mental, recuar assim tão no tempo para te ouvir conversar e sorrir, piano. Sei que os teus momentos são exigentes e sei que de ti as coisas sairão puras, porque precisas desse teu espaço impartilhável como segurança, e o outro apenas para alguns. Mas que te darão tudo. Um dia haverá um tempo de tu voltares, o teu som sairá melhor do que nunca. As saudades que deixas são imensas, os tempos em que me quero mexer e não te tenho por perto fazem-me chorar, mas sei exactamente as teclas da tua alegria, sei por quem és e porque o és, conheço-te muito bem e tu sabes disso, sabes que também que mesmo sabendo as nossas músicas foram perdendo vigor, ou , talvez, aumentaram mesmo e tornaram-se incompreendidas, tanto em ti como em mim. Quero encher-me de mim porque sei que deixei de tocar música há alguns meses. Sempre soube o que era isso contigo e sai sempre um bom sorriso ao pensar. Não é mágoa, nem tristeza pura, é outra coisa sem-nome, arrebatadora. É desequilibrador quando incessante...Memória distante? Sim. Um pouco sim. Talvez o suficiente para teres saído sem as cordas a estremecer. Mas até acho que isso foi bom, sabes, pianinho? Não te censuro, faria o mesmo se sentisse o teu cansaço e as tuas dúvidas. Se sentisse o nosso cansaço, não irrompeste por aí fora e nenhuma corda se partiu, mativeste-te intacto meu piano e agora és teu. Quis ser um destino para ti nestes meses mas não consegui transmitir-to, encher as nuvens de ar novo e chamar os céus menos carregados, pegar no teu leve peso pianinho e levar-te daqui.
Mas alguém te quis levar primeiro e apenas me resta pensar que será o melhor, alguém te levou para voltares a voar e descansar, alguém mais sabe que é isso que precisas, acalmar o teu corpo feminino piano, esse que encerra a mais bela das almas tocadas. Sei que é o melhor, sei que é o que precisas e necessitas para te reencontrares brevemente. Retomar as tuas paixões com essa leveza de querer e ir, sem prisões ou pensamentos perdidos, sem distúrbios ou distracções; sem problemas e inexactidões. Sei e conheço muitos sons teus aos quais não precisei de tocar para saber. Sei porque foi isso que me juntou a ti meu pequeno. És a musicalidade toda e sabes bem disso. Por vezes não fui o músico que precisavas, e sei que não acompanhei na medida certa os teus velhos e sons amigos, bem como os novos que gostavas de experimentar, ouvir e tocar! Sei. Simplesmente sei. Gostava tanto que soubesses ler. Gostava mesmo que conseguisses ler-me pianinho...
Na noite que nos zangámos e fechámos os céus que me traziam o tecto eram fechados, não eram soltos e leves, traziam pouca luz, não foram de papel e quebráveis. Não olhei para ele sequer porque via sempre um céu azulinho que sabia que já não estava ali. O céu tornou-se inenarrável, mas por dentro da tua caixa de música sei que as coisas vão melhorar. Sei os sons que tens por dentro e queres libertar! Sei que és mais, muito mais! Sei tudo o que preciso de saber de ti meu pequeno e lindo piano. Sei porque mundos passeias, e porque céus pretendes chegar, porque ... horizontes, porque sons... Sei a quem me tenho de agarrar, e voltar a sonhar, os dias mais tristes mudarão. Voltar a encher o sorriso novamente, recompôr-me, voltar a Ser. E aí sim... Sonhar bem alto e fazer. Não vou caminhar entre mimetismos porque esconder é mau. Não posso mimetizar, camuflar o que sinto. Não posso pianinho. Nem esquecer tudo o que tocámos. Impossível. Ninguém o faria, acho. A minha sorte é que não me lês e jamais saberás que eu entendo esta paragem. Entendo-a porque também a sinto. Sinto como se fosse o melhor e nós merecemos isso. Merecemos voltar a sorrir e depois quem sabe.. Poderá até ser o que não chegámos a nomear. Qualquer uma delas. Mas agora os tempos são outros...
Voltar a Ser, repensar, reencontrar o Sol a chegar do outro lado, um novo lado do dia; mesmo que seja um Largo dia como tem sido e antevejo. Mas ele chegará. Seja em que forma for, seja que Cor, seja em que tempo. Em que Tempo...
As dores ficam guardadas num sítio diferente das coisas boas. E sei-o sem a eterna dúvida exasperante piano. Os bons ficam numa gaveta aberta para as visitar quando sentir falta.
"A gaveta das coisas boas" a "gaveta das memórias"... A gaveta não é um local totalmente encerrado, nem fechado, é antes um local de visita, não é um local esquecido... É uma parte de tudo o que deve ser lembrado. E sorrir. As pautas que foram tocadas ficam lá, aquelas que correram muito bem, há também aquelas, as outras que simplesmente sobraram. Essas lembro-as eu...
Ai as cores imensas que fazias nos teus momentos. É sorrir que preciso. É lembrar que preciso.
Preciso de recuperar energias, estender-me por calmarias que não sei quando chegarão. Mas este lembrar é bom. Não penso noutros pianinhos, nenhum tocará a tua música. O teu perfumado Ser que retomarás incondicionalmente e sei falhas. Também não quero que percas o tom nem o fulgor que pulsa por dentro da tua madeira. Que ecoa e se expande pela aba aberta ao mundo. Nunca quis que esse som acontecesse num sítio só, que se encerrasse à minha volta. A tua música existe para o mundo, para o céu e para o mar. Oceanos tocados por ti são tudo...És um livro de música como nunca tinha lido. Sabes, por vezes não precisamos de Ler tudo para saber que há um que é o melhor. Melhor, há um que te faz mover de maneira diferente e que te sacode o coração de um jeito bom.
Um dia talvez mande aquilo que escrevi, um dia talvez oiças o que tenho para dizer, porque tu dás-me esse tempo, eu sei. Oiço as tuas notas de sabedoria.
Porque eu sei que tu ainda me ouves. Só não sabes Ler meu Lindo pianinho...Um dia aprenderemos a tocar a dois novamente. Um piano fechado mas não partido. Pode ser tudo o resto, esquecer não.
Até já.
terça-feira, julho 03, 2007
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