segunda-feira, maio 29, 2006

Passado contado

Resolvidos os passados peçonhentos, demito-me na retenção de memórias. Hoje dobrei o lençol da minha cama como nunca o tinha feito. Fi-lo ainda assim como alguma estranheza, a falta desse hábito era mais que evidente; levantei-me distintamente e ao debruçar-me percebi que tinhas ficado. Fitavas-me com olhares perigosos enquanto o debrum do lençol desenhava o teu corpo incansável. Permaneceste porque só eu achei que não tinhas lugar naquela casa arrendada, meio perdida por entre paredes sub-urbanas. Era um casco cheio de falhas amparadas pela vontade do pouco dinheiro que abundava na minha carteira. Senti-lhe o fundo. Lembrei-me que já nem carteira tenho visto que a penhorei naquela ruela por detrás do antigo bairro onde morei. Ela percebe que eu temo que um dia vá embora, como todas as outras fizeram, porque eu sempre quis. Eu temo que ela um dia não apareça; medo de um dia querer. Quero antecipar-lhe a decisão. Talvez não me marterize tanto, penso eu. O facto é que a encontro nas esquinas, nas dobras da casa, encruzilhadas, pelas fotografias preto e branco , pelo seu odor a cores, sem perfume, na roupa espalhada pelo chão que se solta em tábuas. Percorres as poucas divisões; entalada por corredores exíguos e tortuosos. A casa és tu.
Hoje coleccionei mais uma aproximação do que és para mim. Dás-me coragem; no entanto, distancio-me. Detive-me diante do café central e ousei entrar, sentar-me e sonhar uma vida.
Hoje até comprei o jornal do dia, pedi o melhor pão e o café afinal era tão ou mais delicioso do que era falado por aí. Olhar aquele grão bruto e castanho que enfeitava a frente da prateleira superior era um luxo. "Cafés do mundo", dizia. O central era uma sala esplendorosa no centro da cidade onde poucos entravam, nem percebi que era olhado de lado e com desprezo, apenas entrei. Não cheguei a diferenciar-me. Ninguém naquele dia poria-me fora dali. Eu podia ser pobre, podia até estar longe da aparência necessária mas, ali, eu fui sublime. Por momentos quis acreditar que era um frequentador assíduo, não só não o era, como seria o último em que entrava assim com tanta destreza.
Isto porque quero ver-me livre das memórias que me angustiam, estes carimbos de vida que me percorrem a visão por dentro e que eu não preciso. A devassidão que impregna a minha vida prometia acabar. O meu corpo desistirá à próxima tentativa de libertinagem. A dor física sobrepõe-se à outra, sem pena. Não posso submeter-me a tal vexame. Ela que dirá?
Diluído a um rabisco de exemplo, por não ter dado a mínima luta a esta sociedade destrutiva, resolvi deixá-las sob
um vermelho intenso e distorcido da estação de combóios a oriente, na fila dos não lembrados. Parto sem bela nem casco. Vou, mais uma vez, por dentro de memórias vastas.
E eu a tentar rasurá-las por fora.

Wer, wenn ich sch schriee

Quem, se eu gritar
me concede a profundeza inversa deste céu
que ao fim de tarde
eu vejo da minha janela
contemplando os anjos
que as nuvens imitam?

Alguém me ouve se eu gritar?

Oiço vozes
mas são vozes inventadas
porque é inútil perscrutar o silêncio
e por isso vos reinvento
a cada pancada do meu coração
a cada pancada surda
que não repercute
no ímpeto claro do vosso desenho fantástico
no alado lado da vossa impossibilidade.

Se eu gritar
alguém me ouve
em todas estas coisas?

Nenhum anjo
escuta o meu grito
que não penetra a noite
e só encontra eco de nenhum desejo

E lançando de meus braços o desejo
não invejo
admiro
a sufocante beleza deste ocaso
cheio de nuvens velocíssimas
e tudo o que eu sinto
é tão imenso
como este ocaso
dantesco
tiepolesco
wagneriano
que eu contemplo
doente do excessivo amor do que é belo
que me afoga
na sua imensidão aérea

E tão fortuitamente criado pelo vento
e pela terra que se inclina
este ocaso laranja sobre azul
esplêndido e kitsch
é tão impermanente
como vós
nuvens-anjos que me arrebatais
com vossos incêndios imensos e falsos
ilusão de óptica que me fascina e oprime

Encostada à minha janela
contemplo a vossa beleza
que a todo o instante
se faz e se desfaz
até o chiumbo da sombra avançar
e aos poucos surgir a noite
antiga e idêntica sempre
lançando-e em vossos braços
vazios
cheios só de vozes
inaudíveis


Ana hatherly, rilkeana 1999

tracejado

superfícies

domingo, maio 28, 2006

terça-feira, maio 23, 2006

segunda-feira, maio 22, 2006

segunda-feira, maio 15, 2006

Carmo em Esquisso número três

Carmo em Esquisso número dois

Carmo em Esquisso

Flor do medo?

Venha me beijar de uma vez
você pensa demais pra decidir
venha a mim de corpo e alma
libera e deixa o que fornos unir
não vá fugir mais uma vez
vença a falta de ar
que a flor do medo traz
tente pensar
pode até ser mau e tal
mas pode até serque seja demais

tudo vai mudar
posso pressentir
você vai lembrar e rir
alguma dor
que não vai matar ninguém
pode ser vista e nos rondar
não precisa se assustar
isso é clamor
de amor
venha me beijar de uma vez
feito nuvem no ar
sem aflição
venha a mim de corpo e alma
libera a paz do meu coração
não vá se perder outra vez
nesse mesmo lugarpor onde já passou
tente pensar
pode até ser sonho e tal
mas pode até ser
que seja o amor

Djavan, Luanda records

Infinito

Tô perdido por alguém
Não consigo ver nada além
Do que eu digo nada sei
Compreender o amor
Não é de hoje
Já vai longe
E nem sinal
Hoje
Estou longe
Preso a você
Livre na prisão
Sem castigo
Faz chorar
Distraído rói devagar
É pedindo que Deus dá
Por falar no amor
Acho que vou buscar
Viver por você
Ou me acabar
Quem mandou me acorrentar
Fazer-me refém
Nas grades do amor
Te vejo lá no luar
Te espero lá do sol.

© 1984 Luanda, Djavan

Linha do Equador

Luz das estrelas
Laço do infinito
Gosto tanto dela assim
Rosa amarela
Voz de todo grito
Gosto tanto dela assim

Esse imenso, desmedido amor
Vai além de seja o que for
Vai além de onde eu vou
Do que sou,
minha dor
Minha linha do Equador
Esse imenso , desmedido amor
Vai além que seja o que for
Passa mais além do Céu de Brasília
Traço do arquiteto
Gosto tanto dela assim
Gosto de filha música de preto
Gosto tanto dela assim
Essa desmesura de paixão

É loucura de coração
Minha foz do Iguaçu
Pólo sul, meu azul
Luz do sentimento nu
Esse imenso, desmedido amor,
vai além que seja o que for
Vai além de onde eu vou
Do que sou, minha dor
Minha linha do equador

Mas é doce morrer nesse mar de lembrar
E nunca esquecer
Se eu tivesse mais alma pra dar
Eu daria,
isso pra mim é viver.

Djavan/Caetano Veloso

domingo, maio 14, 2006

Com pixeis

Fui ver o fantástico ice age 2 ao cinema há pouco tempo e adorei!
Não tem a cena fabulosa do "hey, Lord of the flames...your ass is on fire!!", a mítica portanto, mas tem outras hilariantes, ainda que não tão estrondosas e marcantes! Pelo meio e tal como no primeiro filme lá aparece uma sequência do pequeno Scrat e as suas epopeias, o tal esquilo pré-histórico, que não larga uma bolota nem por nada. Tal é a gana que todo o "acting" só se traduz em disparate! E que cómico que é ver aquele esquilo com ar-de-estúpido a perseguir a porcaria de uma bolota(ou mais) por entre icebergs e equivalentes. A aflição nos olhos do pequeno bicho é muito expressiva dando quase pena! Depois mantem-se o elenco com sid a preguiça idiota que fala à duffyduck mas com mais estupidez injectada e menos gafanhotos, O manfred, o mamute que impõe bastante respeito no grupo e diria eu: sensatez, e que desta vez se apaixona, e diego, um tigre- dentes-de-sabre que tem o condão de ficar amigo de seres antagónicos e incrivelmente idiotas como foi o caso de Sid no primeiro filme que não o suportava para depois ficarem "pal´s". Ainda nesta nova película surgem os três novos amiguinhos que vão acompanhar estes resistentes da idade do gelo mas que não vou contar. Apenas digo que dois deles, irmãos, são genais!! Não chegam aos calcanhares do Scrat(quase impossível), mas estão bem conseguidos!
Este é um filme muito leve que trará boa disposição a quem o vir! (família, cão e gato)
Ok, não dá para levar o cão e o gato ( eu disse sogra?) ao cinema porque não o permitem, mesmo com o célebre ruído das pipocas...ROMINANTES dos cinemas!!(sempre dá para ver em DVD quando sair, tipo: amanhã ou depois)
Pena que não tenha tido uma "line" marcante tipo a supra-citada a cima no texto e julgo eu, em todas as pessoas que viram o primeiro filme! Contudo achei ao nível do primeiro, não fiquei com a sensação do estigma de que o primeiro da serie é sempre o melhor. O que já por si é um feito!
Este sim é um tema a explorar...
Quais os filmes em que a sequela conseguiu suplantar o original!?
Alguém se lembra de algum?

Claro que já esquecia que a companhia foi boa. Mas isso eu já escrevi num blog da "concorrência" hihihihi!!!

sábado, maio 13, 2006

Sem pixeis

O castelo andante é mais um filme de Hayao Miyazaki acerca de um mundo fantástico com bruxarias e crianças, com vida e com mensagem, como em a "viagem de chihiro" ou "a princesa mononoke".
Quando pensamos que somos bombardeados com as novas tecnologias é bom saber que existe ainda quem explore até à mestria, através do detalhe em cada fotograma dividido em cenário e acção, a pureza do desenho feito com um simples lápis encostado a uma folha de papel sobre o estirador; magistralmente desenhado e pensado surgem dele imediatamente as criaturas que provêm dos sonhos de qualquer criança, de uma criança crescida, que nasce apenas da cabeça de grandes mestres. O universo de um imaginário muito rico associado a um rigor conceptual de mensagem, premisssas de vida já esquecidas, por entre infâncias envoltas em guerra e criadas pelo ocidente. Quando falava por aí em ser uma criança grande, onde meio mundo era ficcionado e a outra não, era desta sensibilidade que falava; desta capacidade de saber reler a infância de um modo inteligente e sabedor. A grande diferença entre aqueles que carregam um génio particular e aqueles que se ficam apenas por ideias desconexas.
O tempo de demora que envolve o processo tem um encantamento único e para mim mais atraente. Define-se como uma paixão. Segue atentamente os passos da história sem perder grão. Miyazaki propõe-nos mergulhar num universo apaixonante que eu tendo a não querer esquecer. E ele ajuda-me ao fazer relembrar...
Vejam.

sábado, maio 06, 2006

What´s up Moleskine? número dois

What´s up Moleskine?

Mário Rita


















A exposição está presente na sala de Professores da Lusíada.

Décima quinta Maratona fotográfica de Lx




A maratona fotográfica deste ano realiza-se dia 19 e 20 de maio.
Para os que se interessam pela fotografia e sobretudo para os que pretendem conhecer melhor a nossa cidade, inscrevam-se!

consultem o site:

http://www.cm-lisboa.pt/?id_categoria=76&id_item=11745