terça-feira, setembro 27, 2005

Tinta homicida

Ontem apareceu uma folha branca na minha mesa da sala.Uma folha simplesmente branca.Vazia. Pronta para ser usada. Mistério. Observei a espessura mínima, a sua dimensão quase invisível,obliquamente posicionado, de soslaio, tomei-a sem o perigo da sua face maior.Branco. Era mesmo branco o papel. Papel sem sombra.Que tentação!Não quis evitar. Distante do centro, afastado, descansava; arrastado para um canto semi-obscuro,
um canto cansado de me ter sempre quando a folha reaparecia.
Reclinado.
Quero aparecer. Subtrair a imagem que me amedronta. Revertê-la em ideia surgir como sempre quando a esqueço
teimas em fugir
foges-me
a tinta sentenciada que não escorre
o meu sangue parado não corre
aflige-me o tempo que se adianta
o movimento é feito ao contrário
tu és toda ao contrário e eu ali,encostado. a rapariga do 3º esquerdo conhece-te bem
aquela que não esqueço
fazes-me do avesso
apareces quando menos espero
desespero
não te controlo
controlas-me
reaproximei-me
tentativa última
usar-te
riscar
rabiscar
não te consigo estragar
sobreviveste sem corpo
Num dia de Outubro/Outono cinza claro
nas tentativas desesperadas dum não autor.
mataste-me sublimemente

segunda-feira, setembro 19, 2005

Fotografar paixão

No outro dia decidi-me
saí à rua apenas com um intuito
sem encenações procurei achá-la ao meu redor
mas que redor?
que limite?
sim, era a paixão
Para isso defini o perímetro
trouxe comigo a velha Yashica que comprei num mercado em Luanda
O seu corpo já denuncia as minhas viagens
Riscos, marcas de guerra. Histórias sem guerra.
A lente relata com a mesma exactidão de sempre
não envelheceram como os meus olhos
não envelhecem sequer
Trouxe nos bolsos os meus velhos rolos Ilford que me compreendem
A velha vizinha do rés-do-chão olhou-me pela janela por detrás da curtina, como sempre.
Já não faço caso. Mas não a consigo ignorar.
A lente de 50mm faz-me avançar de encontro com a verdade
O tacto da máquina continua o mesmo. O seu peso excessivo e o seu difícil manuseamento continuam-me a surpreender.
Distanciei-me do meu estúdio.
Prelúdio.
Decidi apanhar o comboio. Saí na estação que pretendia. Sem enganos, dirigi-me à estação de metro.
Percorri os longos túneis de acesso, desci as escadas devagar sempre à direita e entrei na carruagem.
Enquanto pensava senti os pingos de um chapéu de chuva levantado no antebraço
que frio.
A mulher nem pediu desculpa.
Que surpresa...
Já à superfície senti que a minha foto teria de ser o frio daquele fotograma que iria captar
que queria ter.
Tê-lo só para mim.
Só o frio alterará as circunstâncias no micro-segundo em que dispararei.
Ver a paixão para de repente modificá-la como a gota fria da chuva que seria, por proximidade, uma lente fixa de um ladrão de momentos; eu.
Sem possibilidade de me aproximar por meio de sequências de espelhos convexos que constituem um zoom teria de ser o meu corpo a fazê-lo. Suavemente na rapidez de um possível momento. E então provocar. Provocar-te. sim, sem querer fui para perto do pátio que costumas estar, ler o teu livro, passear. Sim, já sabia para onde ía quando saí de casa.
Não pude contrariar-me, a mim, ao meu movimento mecanizado. Condenei-me à partida. Como pude eu pensar que conseguiria fotografar tal tema sem fotografar-te? Será que algum dia seremos totalmente imparciais? Onde toca a loucura nisto tudo? Estarei louco?
Jamais poderia trair-me na promessa que fiz de não te ver. Esquecer-te. Pôr-te de lado.
Secundarizar-te , devolver-te a um plano anterior onde o tempo já não corre. Não passa.
Onde não te visse . Onde o grão fino da tua voz não estremecesse os contornos da minha vontade. Mas a tua voz...
se ao menos pudesse esquecê-la. Retirá-la pela raiz. Para tonar-se indiferente. Para tornar-me diferente.
talvez para viver sem negativos de que existes.
remeter as recordações nesse plano que já não chegam todos os dias como dantes.
dia-a-dia.
um esforço cerebral.
extenuante.
mas aí,
já estarei a lembrá-la...

domingo, setembro 18, 2005

Lost in translation

Perdido mais uma vez na tradução hoje à noite.

sábado, setembro 17, 2005

Conferência

Eduardo Souto de Moura
+
Phillipe Starck

Hoje ás 15:00 no C.C.B.

quinta-feira, setembro 15, 2005

Corrosão

Sobreposição

Quando te conheci
pueril
chamavam-te um nome qualquer
não comum
Composição era o teu significado
Hoje domino-te
e chamas-te expressão

Camisola

Esculpida em malha grossa
sobredimensionada
aqueço-me
preparo-me para gelar a memória década e ficar com o resto

meses contados

volvidos os meses de prisão
absolvo-me
permito-me a sair

FODAM-SE

Pauta

Renovei a ideia
desenhei as linhas necessárias
uma a uma
imaginei o tempo
encostei as notas ao meu ouvido
decepei a dor
toquei-as sem Dó
toquei sem dó
que nó
sobraram-me todas as outras
notas
realidade
e sem pena nem nota
escrevi a mais longa das músicas
De mim
sobraram as aparas dos lápis usados
perdurarão em pó

Outubro

A Negra apressa-se no revestir da barraca no bairro 1º de maio
A Barraca é feita de papel
O papel da barraca não sustém as novas chuvas
As velhas tábuas de madeira maciça saiem debaixo do colchão
A antiga Fábrica destruída dos comboios já não abriga o velho nem a família,
nem os outros
O dinheiro que sobra dos livros de escola aguenta a fome
A fome persiste e faz chorar a rapariga mestiça, bastarda.
O pai: que besta!
A brancura do horizonte cerca a fragilidade de paredes soltas com olhares altivos
a pena não constrói
a necessidade rouba
paredes sem tecto
tempestade iminente
Os pregos roubados juntam-se aos outros e encerram a fortaleza
fortaleza...
que tristeza
as mãos vincadas e as outras ajudam
mas em vão
inépcia camarária
velocidade amadora
Amadora...

quarta-feira, setembro 14, 2005

Viagem a nenhures

Colecção Berardo

Construtivismo

Possibilidade de nos aproximarmos da obra de Vladimir Tatlin exactamente pelos seus aprendizes.

interessante

Exposição

vi um objecto distante
hoje vi uma escultura.
vivi dentro do objecto
de repente exaltei-me
imaginei-a na minha casa
pedras dissonantes
travertino desgastado
cubos acertados
usados
usei-as
Em pátio
descentrado
parei
Hoje pu-las na minha sala
que encanto
foste mesa japonesa
depois foste chão rastejante
meti-lhe os pés por de cima
que instante
desfoquei
prossegui a mostra
passei o monstro
Carl André

Marcel Breuer

Hoje vi um livro que queria comprar.
um livro encharcado em casas.
em leituras.
pátios.

Concurso?

Não consigo iludir o pensamento do afastamento do desenho.
A realidade já não me oferece nada.

Prazer?

será que estou a perder o prazer de desenhar?

angustia

que angustia.
tenho que fazer 30 coisas ao mesmo tempo
não consigo fazê-las todas
a consciência exacta das coisas tornam-nos cada vez mais sérios
mais incapazes de devolver sem esforço

hoje estou cansado
e nada fiz.
se não fiz tudo, não fiz nada.
não estou contente.

quem me dera ser criança e ultrapassar tudo sem pensar na consequência de não conseguir.

sexta-feira, setembro 09, 2005

Ler devagar

Para quem não conhece, provavelmente um dos bons segredos do bairro alto uma fantástica livraria onde podemos parar um pouco a velocidade estonteante de uma vida de trabalho, sentar, tomar um chá ou um café para estarmos diante de um autor desconhecido ou não, tacteando as páginas tornadas livro, saborearmos o momento nocturno de cabeceira em pleno dia.Perfeito. Leitura/Livros. A música é mais uma banda sonora que faz tanto sentido que nem nos lembramos que ela existe.Uma companhia simpática.
No entanto é sempre diferente, agradavelmente diferente mas sempre no mesmo tom.
O bem estar, contudo, permanece e tende a aumentar.
A simpática dona da loja fala um doce francês que recordo recorrentemente.
Enquanto isso passeio por entre mesas baixas carregadas de palavras.
A estante ergue-se dobrando as paredes. Os livros arqueiam a estante. A estante parece querer soltar-se da parede. A ânsia da novidade absorve-me. Os meus olhos percorrem os títulos, uns certos outros tortos, uns altos outros escondidos, os que já lê-mos, os que gostaríamos de ter e os nossos conhecidos rejeitados, os chamativos visualmente, os chamativos, os interessantes, os temas, o modo, o autor.
A estante percorre-me.
O livro persegue-me.
A escolha acontece.
A sua leitura torna-se inevitável. Mais tarde ou mais cedo. Mas inevitável.

E tudo isto acontece em minutos, o tempo/intervalo de uma tarde qualquer,
que passa na lentidão dos segundos roubados ao relógio.

16 Concurso de Banda Desenhada da AMADORA

Muito provavelmente num ano normal estaria a dar-vos a indicação da abertura do festival Internacional de Banda Desenhada da Amadora que vai já na décima sexta edição.
Porém este é um ano atípico e, como tal, achei que deveria antecipar um dos momentos mais interessantes do Festival: a possibilidade de concorrer com uma banda desenhada totalmente original. Submetidas as mentes criativas/críticas ao tema "Sonhos numa noite de Verão" e às quatro pranchas originais (A4 ou A3) espera-se que de lá advenham as mais hilariantes histórias/estórias (ou não!). A entrega dos trabalhos é realizada até ás 17:00 de 16 de Setembro (não falta muito, apressem-se)

Contactem a C.Municipal da Amadora para mais infos

quinta-feira, setembro 08, 2005

sugestão cinematográfica numero oito?

Hoje não faço sugestões não tenho tido muito tempo para ver filmes.
contudo hoje vou inverter a condição desta frágil secção de cinema.

Façam-me vocês sugestões...
(uma vez mais reticências)

Percurso Certo...(e cá estão as reticências)

Desejo-te boa sorte no limiar de mais um patamar.
"the Force is Strong in this one"...diria o Jedi Obi-Wan-Kenobi para o Master Yoda

quarta-feira, setembro 07, 2005

no tempo do improviso

impulso

Chegaste.
Chegas-te a mim em velocidade de desconfiança
que farsa
que estranho
admiras-te que parti
hoje quero pensar que ficaste
mas sentir que hoje recuei...
que audácia imbecil
chamas-te impulso
e tu
chamas-te passado